ARTIGO: UTILIZAÇÃO DE ARMA DE FOGO X LEGÍTIMA DEFESA PRÓPRIA E\OU DE TERCEIROS

Silvio Damaceno Simora Ribeiro AEVP Instrutor de Tiro Credenciado DPF
Silvio Damaceno Simora Ribeiro
AEVP
Instrutor de Tiro Credenciado DPF

Esta matéria a qual vamos discorrer tem como finalidade demonstrar a importância do esclarecimento da legítima defesa inserida no meio social, haja vista que o Estado não é onipresente (ou seja, não está em todos os lugares ao mesmo tempo, suas forças de segurança pública, as polícias Civil e Militar, por mais que atuem em coibir os delitos e crimes que assolam este nosso estado da federação, não conseguem defender o cidadão, estatística esta que vem a cada dia aumentando, assaltos, furtos, sequestros, latrocínios, etc…), corroboram para este crescimento na tão famosa “Mancha Criminal”, mapa este a qual nenhum Governante quer ver em evidência em seu estado.

Utilizando-se dessa prerrogativa foi conferida ao cidadão a autotutela, ou seja, a capacidade de defesa com a utilização das próprias mãos. “LEGITÍMA DEFESA” e reforçando esta legalidade emitida pelo poder maior, e através do Ministério da Justiça, sobre égide da fiscalização da polícia Federal, fora sancionada pelo excelentíssimo Presidente da República, a Lei Federal, Nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, intitulada, Estatuto do Desarmamento, que regula, fiscaliza a venda e comercialização de armas de fogo em âmbito nacional, e que prevê ao cidadão a autorização de ter em sua residência ou estabelecimento, sua arma de fogo para sua defesa pessoal, elenca também dentro das Instituições federais, estaduais e municipais, a autorização para portar armas de fogo, ainda que fora de serviço, e com a nova Lei n.° 12.993 de 17 de junho de 2014, que altera a Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003, para:

“Conceder porte de arma funcional para permitir que agentes e guardas prisionais e agraciando aqui no Estado de São Paulo aos (Agentes de Segurança Penitenciária – ASP, Agente de Escolta E Vigilância Penitenciária AEVP) tenham o porte de arma de fogo mesmo fora de serviço e em todo o Território Nacional, e autoriza o mesmo a portar os calibres de uso permitido, elencados no Decreto Nº 3.665, de 20-11-2000, e suas alterações”.   

Este tema é de fundamental importância para nós servidores da Secretaria de Administração Penitenciária – SAP, pois qualquer cidadão comum está sujeito a um ataque contra a sua integridade física, e ainda mais em nosso seguimento profissional, no qual nestes últimos dias temos vistos acontecimentos envolvendo investidas criminosas contra nossos servidores desta pasta, elevando ainda mais as estatísticas da criminalidade. Portanto digamos que é necessário sabermos que contamos com um instituto que resguarda o cidadão de agressões injustas.

O objetivo geral deste estudo é analisar as causas que excluem a antijuridicidade do fato típico, determinar as situações possíveis de utilização da legítima defesa pela sociedade, analisar as forma de proteção do Estado. O objetivo específico é analisar os requisitos para a existência da legítima defesa, analisar os casos em que é possível o emprego do instituto em benefício de terceiros, bem como diferenciar legítima defesa da vingança.

A pesquisa abrange consultas a livros específicos da área, com autores de notável saber jurídico como: Damásio Evangelista de Jesus, Júlio Fabrini Mirabete, Luiz Alberto Ferracini, Gabriel César Zaccaria de Inellas, Ney Moura Teles, Magalhães Noronha, dentre outros bem como as Leis e a Constituição Federal de 1988.

A importância do instituto da legítima defesa no ordenamento jurídico penal abordado verifica-se o dever do Estado para com o cidadão, os seus mecanismos de defesa, bem como a sua ineficiência, neste caso o próprio Estado confere ao cidadão a prerrogativa de se autodefender, por meio da legítima defesa própria e de terceiros.

 

 

 

 

 

 

LEGÍTIMA DEFESA

Histórico

O instituto da legítima defesa se confunde com a história do próprio homem. A defesa da própria vida encontra-se ínsita no ser humano, desde épocas remotas. Segundo Inellas (2001, p. 53) “O instinto da conservação surge tão imperioso, que teve logo, reconhecimento em todas as legislações, passando a ser considerada a defesa, como ação conforme o Direito, como legítima” este posicionamento contraria a sistemática anterior que a considerava simplesmente como ação não punível.

A história da legítima defesa não é ponto pacífico entre os doutrinadores, alguns sustentam que este instituto não possui história. Os bárbaros reconheciam que o agente que praticava um crime em legítima defesa estava isento de pena.

A legítima defesa era reconhecida pelos Códigos antigos da Grécia, Índia e Roma, nestes permitia-se o exercício do direito de defesa da própria vida e da honra. Dentre os germanos tornou-se uma característica particular oriunda do direito de vingança e da privação da paz pelo agressor injusto. Jesus (1999, p. 382) assevera que: “O Direito Canônico tirou da legítima defesa o caráter de direito, convertendo-a em necessidade escusável, submetida a penitências religiosas e à exigência de fuga do agredido, embora estatuindo o dever de defender terceiro”.

Conceito

Conceituar nunca foi um atributo muito fácil. O conceito deve ser abrangente. O conceito de legítima defesa não obstante também apresenta suas dificuldades, podemos considerar o conceito inserido no Código Penal no seu artigo 25 que dispõe: “Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”.

Poucos doutrinadores se arriscam em formar um conceito de legítima defesa, diferentemente do Código Penal. Vejamos a definição de acordo com as palavras do renomado doutrinador Inellas (2001, p. 60) “A legítima defesa é o direito indiscutível, inalienável e irreversível, que toda pessoa possui, de se defender, defender seus entes queridos ou terceiros inocentes, de ataques violentos e irracionais, repelindo a força com a força”.

Este conceito é bastante abrangente, mas peca no sentido de afirmar que o direito a legítima defesa é indiscutível, É perfeitamente discutível. Não podemos alegar o instituto da legítima defesa em qualquer circunstância, é necessária uma análise profunda do caso concreto – um homem não pode alegar uma agressão em legítima defesa, só por que outro homem olhou para sua mulher com olhos lascivos. Até então tudo permanece no mundo subjetivo, a Lei protege aquele que sofre uma ação concreta e não aparente.

O exercício da legítima defesa é uma função do Estado. O cumprimento deste direito não é uma exclusividade da máquina estatal e sim da sociedade bem como do particular.

Natureza Jurídica

São estabelecidos dois grupos de teorias que procuram fundamentar a legítima defesa: a) teorias que entendem o instituto como escusa e causa de impunidade; b) teorias que fundamentam o instituto como exercício de um direito e causa de justificação.

Estas teorias são criticadas pelo professor Damásio, que no seu entender “Teorias por demais restritas uma vez que se baseiam exclusivamente no homicídio, deixando de lado outros bens jurídicos que podem ser lesados por vários crimes”. (JESUS, 1999, p. 383).

O Ilustre Professor define sua posição com relação à natureza jurídica deste instituto: “Entendemos que a legítima defesa constitui um direito e causa de exclusão da antijuridicidade. O homicídio cometido em legítima defesa é voluntário, não se castigando o autor porque se fundamenta na conservação da existência”. (JESUS, 1999, p. 383).

O nosso Código Penal define a natureza da legítima defesa no art. 23, II “A legítima defesa é exclusão da antijuridicidade”.

REQUISITOS DA LEGÍTIMA DEFESA

Os requisitos da legítima defesa são extraídos do seu próprio conceito inserido no Art. 25 do Código Penal Brasileiro. Vejamos a classificação dos requisitos:

a) Agressões injustas, atuais ou iminentes;
b) Direito do agredido ou de terceiro, atacado ou ameaçado de dano pela agressão;
c) Repulsa com os meios necessários;
d) Uso moderado de tais meios;

 Agressões injustas, atuais ou iminentes.

Para melhor entendermos este requisito da legítima defesa é necessário entendermos o significado de agressão. Segundo Ferreira (1993, p. 17) Agressão sf. Ação ou efeito de agredir. Agredir v. t. 1. Acometer, atacar. 2. Injuriar. 3. Ter conduta hostil a. 4. Bater em; surrar.

A psicologia geral assim se posiciona com relação à agressão:

A agressão, como motivo social, ilustra muita dos problemas de tais motivos. A agressão é um tipo de comportamento caracterizado como hostilidade e destrutividade orientadas para outros indivíduos; mas o motivo subjacente nesse comportamento pode ser muito difícil de identificar. Os atos agressivos ocorrem em resposta parcial a motivos de sexo, fome e dominação mais, haverá também um motivo independente para a agressão? A agressão destaca-se como um motivo instintivo na teoria da personalidade de Freud e está vinculada ao instinto de morte. Outros teóricos, como Miller e Dollard, associaram a agressão ao estado de frustração, sustentando que a agressão é aprendida em resposta a certos sinais ou pistas em que a emoção da cólera é normalmente suscitada. O motivo agressivo tem, em teoria, uma base lógica mais o isolamento de exemplos de agressão como um motivo “puro”, isto é, não contaminado por outros motivos, tem sido difícil de se obter. São conhecidas as espécies de situações que geram comportamentos agressivos (frustrações, irritações constantes etc.) mais a identificação de um motivo separado de agressão tem sido muito esquiva não está provado que seja útil. (EDWARDS, 1972, p. 88).

O eminente professor Jesus (1999, p. 384), assim define agressão injusta: “Agressão é a conduta humana que ataca ou coloca em perigo um bem jurídico”. “O ataque de animais ao homem não enseja legítima defesa e sim estado de necessidade. Se o sujeito açula um cão bravio contra a vítima, caracteriza-se a legítima defesa”. O cão foi utilizado como instrumento de agressão contra a vítima. O instituto da legítima defesa exige agressão, mas, esta não é um fator obrigatório como bem explica Jesus (1999, p. 384) “Embora na maior parte das vezes a agressão se faça mediante violência (física ou moral), isso não é imprescindível. Ex. A pode agir em legítima defesa contra B, que está prestes a cometer um furto mediante destreza contra C”.

Observa-se que a agressão não é um fator determinante da legítima defesa.

A agressão deve ser injusta contra o direito, próprio ou de terceiros. Quem mata em legítima defesa comete um crime descrito no art. 121 do Código Penal, embora a conduta seja típica o agressor não comete crime. Noronha (1997, p. 197) assim nos esclarece: “Seu gesto não é ilícito; conta a seu favor com uma causa que exclui a antijuridicidade do fato. Por isso é que se diz ser tipicidade elemento indiciário desta”. Agressão atual é a agressão presente que está se realizando. Ex. A está agredindo B utilizando-se de um pedaço de ferro e A é muito superior fisicamente a B trata-se de um ato de covardia, tendo em vista que B está desarmado e é inferior fisicamente. Se B tomar posse de uma pedra e lançar contra A acertando lhe a fonte e se este vier a falecer, B agiu em legítima defesa atual.

Não é cabível a legítima defesa contra uma agressão que já cessou, ou uma agressão futura, ou mediante ameaça que esteja desacompanhada de perigo concreto e imediato. Com relação a esta matéria Teixeira (1996, p. 67) muito bem assevera: “Não é a vingança ou o medo que explicam e legitimam a reação, mas a necessidade de defesa urgente e efetiva do bem ameaçado, e que só a agressão atual justifica”.

Direito do agredido ou de terceiro.

Para o titular do bem jurídico que está sujeito à agressão, há duas formas de legítima defesa, as duas formas estão prevista no art.25 do CP. Segundo as palavras do eminente Professor Jesus (1999, p. 387) “(a) legítima defesa própria: ocorre quando o autor da repulsa é o próprio titular do bem jurídico atacado ou ameaçado; b) legítima defesa de terceiros: ocorre quando a repulsa visa a defender interesse de terceiro”.

A agressão pode ser dirigida contra qualquer bem jurídico, não existe mais a limitação à defesa da vida ou da incolumidade física. O direito a ser tutelado pode ser próprio ou de terceiros.

Segundo Teixeira (1996, p. 71) “Qualquer bem, portanto é suscetível de ser protegido pela legítima defesa. O bem ou o interesse defendido pode ser próprio ou alheio – outrem pode ser pessoa física ou jurídica, inclusive o Estado”. Quando a intervenção for a favor de terceiro independerá de sua vontade ou de seu conhecimento.

A legítima defesa de terceiro consagra o sentimento de solidariedade inerente ao ser humano. Não é necessária relação de parentesco ou amizade com o terceiro em favor de quem exercita a legítima defesa. O terceiro agredido pode ser uma pessoa jurídica, o nascituro, a coletividade e também o próprio Estado.

A legítima defesa de terceiros inclui a dos bens particulares e também o interesse da coletividade (como na hipótese da prática de atos obscenos em lugar público, da perturbação de uma cerimônia fúnebre etc.), bem como do próprio Estado, preservando-se sua integridade, a administração da justiça, o prestígio de seus funcionários etc. (MIRABETE, 2002, p. 185).

Repulsa com os meios necessários.

Meio necessário é o que o agente dispõe no momento para eliminar o perigo. Dentre as inúmeras possibilidades de defesa, é de se escolher aquela que conduza o menor dano. Eis uma questão não muito fácil de ser definida, por que a vítima na iminência de um ataque contra a sua vida dependendo da situação não vai conseguir discernir o meio adequado para se defender. Há de considerar-se que no momento da agressão a vítima não se encontra em sã consciência, encontra-se dominada pelo pavor, preocupando-se simplesmente em salvar a sua vida.

Barro (1999, p. 263) assim se manifesta: “O meio necessário, desde que o único disponível para rechaçar o perigo, pode ser desproporcional à agressão injusta, justificando a legítima defesa, desde que empregado de maneira moderada”. O doutrinador Barros (1999, p. 263) cita o seguinte exemplo: “Para fazer cessar a subtração de jabuticaba, o agente aponta fuzil para os larápios. É evidente que não poderá efetuar disparos, sobretudo na direção dos ladrões, sob pena de incidir em excesso”.

Uma arma de fogo pode ser o meio necessário para obstar uma agressão praticada com os próprios punhos. Uns sujeitos franzinos, raquíticos, que tenha uma arma de fogo à sua disposição, agredido a murros por um lutador de artes marciais, deve utilizar o revolver como o meio necessário para se defender, ainda que junto dele exista um porrete, ou uma barra de ferro. Tais instrumentos, nas mãos do frágil cidadão, podem, a toda evidência, ser aquém do necessário para impedir a agressão do exímio lutador. Se o sujeito tem a seu dispor vários instrumentos, ou pode utilizar-se de vários meios contra a agressão, deve, é evidente, escolher aquele que, com eficiência, resulte no menor dano ao agressor. (TELES, 1998, p. 242).

A legítima defesa é um misto de objetividade e subjetividade a questão não deve ser analisada fora da esfera real porque cada caso é uma situação diferente que merece uma análise profunda e detalhada por parte do magistrado.

Uso moderado dos meios necessária na legítima defesa própria ou de terceiros.

Barros (1999, p. 264), definem muito bem o uso moderado: “Diz-se moderado o uso do meio quando é empregado na medida suficiente para repelir a agressão”. Segundo Jesus (1999, p. 390) “O requisito da moderação na reação é muito importante porque delimita o campo em que pode ser exercida a excludente, sem que se possa falar em excesso”. O sujeito na sua defesa deve agir com moderação, ou seja, não deve fazer uso da força em excesso, caso haja assim, estará incorrendo em lesão do bem próprio ou de terceiro. A moderação implica à proporção que deve existir entre a agressão e a reação.

Os meios necessários são os que causam o menor dano possível à defesa do direito em discussão. A necessidade da defesa em tese se determina de acordo com a força real da agressão.

Deve o sujeito ser moderado na reação, ou seja, não ultrapassar o necessário para repeli-la. A legítima defesa, porém, é uma reação humana e não se pode medi-la com um transferidor, milimetricamente, quanto à proporcionalidade de defesa ao ataque sofrido pelo sujeito. Aquele que se defende não pode raciocinar friamente e pesar com perfeito e incomensurável critério essa proporcionalidade, pois no estado emocional em que se encontra não pode dispor de reflexão precisa para exercer sua defesa em eqüipolência completa com a agressão.

Cabe ao Estado a função de proteger a sociedade, é uma missão quase impossível tendo em vista que o mesmo não pode estar em todos os lugares ao mesmo tempo para proteger cada cidadão. No entanto todos os seres da natureza possuem os seus mecanismos de defesa. Os animais geralmente atacam quando estão famintos, os intuitos é somente saciar a sua fome, trata-se de um fenômeno natural da cadeia alimentar. O homem por ser um animal racional não age dessa forma, muitos são os interesses que os levam a praticar atos ilícitos à sociedade visando o interesse próprio; homicídio, estupro, furto, roubo, seqüestro, agressão corporal, são apenas alguns exemplos de como o agente interfere na vida do próximo. Para combater os atos contrários as normas de conduta da sociedade o Estado estabelece meios para o cidadão se defender, haja vista que uma sociedade por mais perfeita que seja, não consegue conviver sem o crime. No aspecto formal crime é conceituado segundo Jesus (1999, p. 151) “é um fato típico e antijurídico”.

É dever do Estado regular e zelar pela boa conduta de vida social. Prevendo os acontecimentos em que se invoca a legítima defesa o Estado assegurou as excludentes da ilicitude, quem pratica homicídio em legítima defesa está amparado pela legislação. A sua ação constitui um fato típico, mas não é antijurídico. Lutar pela própria sobrevivência é um dever da espécie humana.

Observa-se que o instituto da legítima defesa foi inserido nas normas objetivas, ou seja, normas que provém do próprio Estado, trata-se de normas de direito positivo, sobrepondo-se as outras leis. A legítima defesa é um direito inerente ao individuo, na ausência do Estado para proteger o bem tutelado, deve o próprio indivíduo proteger-se, como muito bem assevera Teles (1998, p. 237) “É, portanto, direito de todo homem, diante de uma agressão, poder realizar, por sua conta, o fim do direito. Diferentemente do estado de necessidade, em que o sacrifício do outro bem deve ser inevitável, na legítima defesa o agredido não está obrigado a fugir”.

A legítima defesa não é alegada somente no caso de particular para particular, é comum autoridade agirem com abuso de autoridade, neste caso, deve ser apurado os fatos o responsável deverá ser penalizado, podendo até mesmo deixar o serviço público, por isto o Estado desenvolveu sistemas de proteção, como muito bem assevera Meirelles (1990, p. 415-416) “Os servidores públicos, no desempenho de suas funções ou a pretexto de exercê-las, podem cometer infrações de três ordens: administrativa, civil e criminal. Por essas infrações deverão ser responsabilizados no âmbito da Administração e perante a Justiça Comum”.

Excesso de poder – O excesso de poder ocorre quando a autoridade, embora competente para praticar o ato, vai além do permitido e exorbita no uso de suas faculdades administrativas. Excede, portanto sua competência legal e, com isso, invalida o ato, porque ninguém pode agir em nome da Administração fora do que a lei lhe permite. O excesso de poder torna o ato arbitrário, ilícito e nulo. (MEIRELLES, 1990, p. 96).

Asseguramos que o cidadão comum diante de determinadas circunstâncias pode alegar a legítima defesa contra atos vexatórios que ferem a sua integridade, diante de representantes do Estado que agem com excesso como muito bem preceitua o Código Penal brasileiro:

Art. 350. Ordenar ou executar medida privativa de liberdade individual, sem as formalidades legais ou com abuso de poder:

Pena – detenção, de 1(um) mês a 1(um) ano.

Preceitua a Constituição Federal no seu artigo 5º XI “a casa é asilo inviolável do individuo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”. A regra geral determina que, ninguém pode fazer valer do seu direito pela própria força, porque se assim fosse o homem estaria voltando ao seu estado primitivo, mas nem sempre as pessoas podem recorrer ao Estado para a devida proteção de seu direito, assim sendo o Estado permite a autotutela, onde se enquadra a legítima defesa própria e de terceiros.

O ordenamento jurídico brasileiro visa à proteção dos bens juridicamente tutelados. Portanto o Estado não só pune como previne, mesmo que seja de forma violenta para a proteção de bens próprios ou alheios atacados de forma injusta. O ato de violência é a principal forma de defesa humana, como muito bem define a doutrina filosófica:

Ineficiência Estatal.

Em face da inoperância estatal, muitos trabalhadores que reagem a assaltos ou a outros crimes acabam nos presídios brasileiros, inclusive recebendo o mesmo tratamento de marginais enclausurados por delinqüir a sociedade. Em alguns casos a vítima mata o seu agressor agindo em legítima defesa. A pessoa que se defende de um ataque injusto deve sentir-se protegida a partir do momento da agressão. No entanto não é isto que ocorre, algumas leis ultrapassadas muito contribuem para com a falta de respeito com o cidadão comum.

Um homicídio praticado em legítima defesa não deve ter a mesma conotação de um crime comum. A nossa Lei Processual Penal determina que a autoridade policial autue o autor em flagrante delito, mesmo que seja em legítima defesa. Devido à morosidade da justiça o Agente ficará alguns dias, ou talvez até meses, esperando a decisão judicial, enquanto isto ele vai convivendo com marginais da pior espécie, sendo maltratado, humilhado, desrespeitado na sua integridade física, ou seja, é uma violação aos preceitos constitucionais tão bem assegurados na nossa Constituição Federal. Segundo o professor Lélio Braga Calhau da Faculdade de Direito do Vale do Rio Doce e promotor de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais é necessário fazer mudanças na legislação processual penal:

[…] faz-se necessário alterar a lei processual penal para impedir que a autoridade policial autue em flagrante aquele que reagiu a uma agressão injusta, matando seu ofensor. Se o próprio delegado de polícia ouvir a vítima, verificar que o mesmo agiu em legítima defesa, deveria a legislação processual penal autorizar que a autoridade policial, e não só o juiz de direito, após a sua oitiva o liberasse para responder ao processo em liberdade .

São varias as formas de prisão em flagrante, segundo Capez (2000, p. 219) “O termo flagrante provém do latim flagare, que significa queimar, arder. É o crime que ainda queima, isto é, que está sendo cometido ou acabou de sê-lo”. A doutrina Processual Penal elenca uma série de flagrantes, o flagrante próprio é assim definido pelo eminente doutrinador:

Flagrante próprio – (também chamado de propriamente dito, real ou verdadeiro): é aquele em que o agente é surpreendido cometendo uma infração penal ou quando acaba de cometê-la (CPP, art. 302, I e II). Nesta última hipótese, devemos interpretar a expressão “acaba de cometê-la” de forma restritiva, no sentido de uma absoluta imediatidade, ou seja, o agente deve ser encontrado imediatamente após o cometimento da infração penal (sem qualquer intervalo de tempo). Capez (2000, p. 219)

A segurança pública no Brasil atua de forma precária, a concorrência entre o crime organizado e a polícia é desleal enquanto nossos policiais usam revolveres calibre 38 e ou Pistolas calibre .40 os bandidos usam pistolas automáticas, fuzis de alta precisão. O crime organizado leva esta conotação não por acaso, eles realmente trabalham como se fosse uma empresa bem sucedida. Antes de atacarem uma vítima eles fazem cálculos precisos chegam a ser comparado a investidores do mercado financeiro.

Embora o Brasil seja um País de terceiro mundo e tenha uma péssima distribuição de renda onde o desemprego atinge níveis bastante elevados, não é o suficiente para justificar tanta violência contra a população. O problema está mais ligado a questão da sensação de impunidade, se o risco de ser preso em um assalto é considerado baixo, então eles aumentam o investimento em armamentos pesados e lutam para atingir os seus objetivos.

Algumas das delegacias ainda são equipadas com máquinas de escrever em plena era da informática, os processos demoram muito tempo para serem julgados, o número de juízes são insignificantes em relação à população. Os policiais militares que trabalham no corpo a corpo com os bandidos não são bem preparados, suas remunerações não atingem as suas necessidades básicas, moram nos mesmos bairros da qual moram os bandidos, a proteção à sua família é inexistente.

Entre o Estado e a marginalidade está o cidadão comum, sozinho, jogado à própria sorte, não se tem paz nem no interior dos lares, os telejornais mostram sempre a ousadia dos bandidos, cada vez menos temente ao Estado. Providências devem ser tomadas de imediato para que a sociedade possa viver com dignidade.

CONCLUSÃO

O estudo da legítima defesa foi feito com base na compilação de dados doutrinários, bem como consulta as jurisprudências referentes ao assunto. Existem divergências com relação aos doutrinadores quando se refere à história da legítima defesa. Incorre em grave erro os que consideram a defesa individual um direito inato, reconhecido em todos os tempos e lugares. A noção jurídica da legítima defesa somente surgiu quando o Estado reclamou para si o castigo do autor em face da prática de uma ofensa pública ou privada. O instituto da legítima defesa faz parte da própria natureza humana, portanto é um direito natural, absorvido pelo direito positivado como consta em nosso ordenamento jurídico.

A legítima defesa constitui um direito e causa de exclusão da antijuridicidade. Para ser utilizada é necessário preencher os seus requisitos que são: agressões injustas, atuais ou iminentes, direito do agredido ou de terceiro, atacado ou ameaçado de dano pela agressão, repulsa com os meios necessários, uso moderado de tais meios. Ocorre a legítima defesa própria quando o autor da repulsa é o próprio titular do bem jurídico lesado ou ameaçado, a legítima defesa de terceiros ocorre quando a repulsa visa à defesa de interesse de terceiros. Na legítima defesa de terceiros não é necessário que haja relação de parentesco ou amizade.

A repulsa com os meios necessários são os meios de que dispõe o agente no momento da sua autotutela que deve ser proporcional a agressão. A medida da repressão deve ser analisada no caso concreto devido à necessidade de se avaliar o valor do bem agredido, as circunstâncias que levaram o individuo a praticar a legítima defesa. Quem agride inicialmente sem motivo justo não pode alegar legítima defesa porque deu causa a questão.

O uso moderado é o uso do meio adequado para repelir a injusta agressão. Não pode um pai de família alegar legítima defesa quando atira em crianças que sobem no seu muro para subtrair frutas, existe uma desproporcionalidade entre a agressão e a repulsa com os meios necessários.

A importância do instituto no ordenamento jurídico penal. Cabe ao Estado a proteção social, mas dentro das suas limitações não tem como haver proteção no âmbito geral tendo em vista que o Estado não é onipresente. Prevendo esta situação o legislador criou o instituto da legítima defesa, ou seja, conferiu ao cidadão a capacidade de se defender com as próprias mãos proveniente de ataque atual ou iminente. Faz-se necessário que o ataque seja atual porque legítima defesa não é vingança, se o agente não revidar na hora e se assim o fizer horas depois não estará agindo em legítima defesa e sim com vingança, portanto responderá criminalmente pelo crime que cometer.

A legítima defesa não é privativa de particular contra particular, deve ser invocada contra o próprio Estado. Quando um servidor público qualquer age com abuso de poder e alguém se sentir provocado e reagir, desde que sua ação não seja proveniente de ato ilícito, também estará amparado pela legítima defesa.

E finalizando este estudo, trazendo-o para campo de nossos servidores estarem com suas armas particulares e futuramente com armas acauteladas pelo estado através de nossa Secretaria, traz a luz, a questão de que temos:

“Servidores concursados, e devidamente capacitados através de exames psicotécnicos, preparação de Formação Técnica,Capacitações e Aperfeiçoamentos, para desenvoltura de seus cargos com empregos de armas de fogo, e que desde 2002 provaram com dados de eficiência, eficácia e utilizando quando de ação em situação de emprego de força letal, pautando sempre no uso escalonado da força, desde coibir fuga, arrebatamento, tentativa de fuga, contenção de rebelião, restabelecimento da ordem em unidades de Alta Contenção, bem como todas as unidades superlotadas desta pasta, com objetivos de que quando fora de serviço, possa estar fazendo uso de seu armamento particular ou do estado, e conhecedor de que quando em necessidade e sempre dentro da legalidade possa a vir a utilizar (empregar) esta ferramenta, sua arma de fogo, que é de seu conhecimento o último recurso dentro da escala de emprego do Uso Modificado da Força, venha a fazer de forma moderada, de forma proporcional dentro da conveniência, a qual a ocasião assim necessite”.

 

 

 

 

 

 

 

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