Grande repercussão teve o Decreto nº 62.030/2016 publicado no dia 17 de junho. O funcionalismo do Estado de São Paulo o viu como a porta de entrada para conseguirem a sonhada aposentadoria especial aos 25 anos de contribuição e exercício de atividades de risco ou que prejudiquem a saúde e a integridade física (conforme disposto no artigo 40, §4º, II e III da Constituição Federal) e em paridade com o estipulado no Regime Geral da Previdência Social (RGPS).
Todavia, o Decreto não fala em tempo de aposentadoria, apenas regulamenta o procedimento de avaliação das atividades para fins de caracterização da aposentadoria especial. Ele seria primordialmente aplicável às carreiras que não tenham a aposentadoria especial regulamentada, portanto, suscetíveis de aplicação da regra geral do RGPS por força da Súmula Vinculante nº 33 do STF, que diz:
“Aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do regime geral da previdência social sobre aposentadoria especial de que trata o artigo 40, § 4º, inciso III da Constituição Federal, até a edição de lei complementar específica. “
Para o cargo de AEVP, a aposentadoria especial já é regulamentada por lei específica, a Lei Complementar nº 1.109/2010, de modo que não se aplica a regra geral do RGPS.
O STF já decidiu de forma desfavorável especificamente sobre a aposentadoria dos AEVPs, nas variadas tentativas de se obter a aposentadoria com 25 anos de contribuição (veja abaixo íntegra do acórdão proferido pela Min. Carmen Lúcia).
Assim, qualquer alteração no tempo de aposentadoria do AEVP somente será possível com publicação de nova Lei Complementar, mesmo que seja apenas para revogar a LC nº 1.109/2010, mas não por decretos.
Portanto, em resposta às várias consultas dos associados, o decreto em questão não trouxe novidades aos AEVPs em relação ao tema.
Drº.Alexandre Alves de Godoy
Diretor Jurídico do Sindespe
DECISÃO
MANDADO DE INJUNÇÃO. ALEGADA AUSÊNCIA DE NORMA REGULAMENTADORA DO ART. 40, § 4º, INC. II DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. AGENTE DE SEGURANÇA PENITENCIÁRIA DE SÃO PAULO. EXISTÊNCIA DE LEI REGULAMENTADORA. MANDADO DE INJUNÇÃO AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO.
Relatório
1. Mandado de injunção, com pedido de medida liminar, impetrado por Jair Alves dos Santos, em 21.2.2013, contra pretensa omissão legislativa imputada ao Presidente da República, ao Presidente da Câmara dos Deputados, ao Presidente do Senado Federal e ao Governador do Estado de São Paulo.
2. O Impetrante alega ser servidor “público, devidamente nomeado por aprovação em concurso púbico, exercendo suas funções em cargo efetivo, como Agente Segurança Penitenciária na Penitenciária II de Pirajuí/SP a mais de 25 anos ininterruptos, haja vista que o autor deu inicio ao serviço público dia 13 de Agosto de 1986, conforme Certidão de Contagem de Tempo de Serviço assinado pela diretora da Unidade Prisional” (fl. 1).
Sustenta que “tem fundamentos legais para sua aposentadoria especial por trabalhar 25 anos em local insalubre, com fulcro no Artigo 40, § 4º da Constituição Federal e artigo 57 da Lei n. 8.213/91, tomando-se de empréstimo o primeiro quanto ao tempo de serviço e o segundo, quanto ao local insalubre prestado, formando-se assim o direito subjetivo a sua aposentadoria especial, assim de forma liminar, o Impetrante tem que ser afastado de suas funções com recebimento integral de seus proventos até o julgamento final desta ‘writ’, haja vista presente o ‘fumus boni iuris’ bem como o ‘periculum in mora’” (fl. 2).
Salienta que “o artigo 40, § 4º, da Constituição Federal é típica norma de eficácia limitada, uma vez que para implementação da aposentadoria especial do servidor público em condições especiais, exige-se a publicação de ‘Lei Complementar’, e que até o presente momento não foi editada, pelo Estado de São Paulo” (fl. 6).
Pede o benefício da justiça gratuita e:
“A) Seja a presente ação constitucional julgada de imediato procedente, suprindo a lacuna normativa e garantindo o direito a averbação do tempo de serviço em condições especiais de trabalho, perante o atual regime jurídico único, Lei 8.112 de 11/12/1990, conforme Mandado de Injunção n. 5232 , mencionado na exordial;
B) Seja suprida a omissão concernente à inexistência de lei complementar regulando a aplicação do § 4º, do artigo 40 da Constituição Federal, com redação da Emenda Constitucional n. 47/05;
C) Seja garantindo ao Impetrante de forma liminar, haja vista a presente do ‘fumus boni iuris’ bem como do ‘periculum in mora’, o direito a adoção da Lei 8.213/91, lei geral da Previdência Social, para a concessão de contagem do tempo de serviço prestado em condições especiais, onde no presente caso trata-se de local insalubre em grau máximo, onde requer o Impetrante de imediato que seja afastado de suas funções de Agente de Segurança Penitenciária, ao qual faz jus ao recebimento integral de seus proventos, pois trabalhou mais de 25 anos ininterruptos em local com grau máximo de insalubridade, ou seja, nas Penitenciárias, localizadas no interior do Estado de São Paulo” (fls. 18-19, doc. 2).
Examinados os elementos havidos nos autos, DECIDO.
3. Defiro o pedido de justiça gratuita, nos termos do art. 4º da Lei n. 1.060/1950 c/c o art. 62 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.
4. O mandado de injunção é garantia constitucional prestante, exclusivamente, a viabilizar direitos ou liberdades constitucionais, bem como a soberania, a cidadania e a nacionalidade, quando não puderem ser exercidos por ausência de norma regulamentadora (art. 5º, inc. LXXI, da Constituição da República).
Pressupõe, portanto, a existência de preceito constitucional dependente da regulamentação por outra norma de categoria inferior na hierarquia dos tipos normativos.
Neste mandado de injunção, o Impetrante alega que a ausência da norma regulamentadora do art. 40, § 4º, inc. II, da Constituição da República tornaria inviável o exercício do seu direito à aposentadoria especial, pois os termos para sua aposentação deveriam ser definidos por lei complementar.
5. O Supremo Tribunal Federal reconheceu a mora legislativa do Presidente da República para regulamentar o art. 40, § 4º, inc. III, da Constituição da República e determinou a aplicação da regra do art. 57 da Lei n. 8.213/1991, de modo a viabilizar que a Administração Pública analise o requerimento de aposentadoria especial formulado por servidor público que exerce suas atividades em condições insalubres. Nesse sentido: MI 721, Rel. Min. Marco Aurélio, Plenário, DJe 30.11.2007; MI 788, Rel. Min. Ayres Britto, Plenário, DJe 8.5.2009; e MI 795, de minha relatoria, Plenário, DJe 22.5.2009.
Ao apreciar questão de ordem suscitada pelo Ministro Joaquim Barbosa no julgamento do Mandado de Injunção n. 795, de minha relatoria, decidiu-se que os Ministros do Supremo Tribunal poderiam julgar, monocraticamente, os mandados de injunção que objetivassem garantir aos impetrantes o direito à aposentadoria especial a que se refere o art. 40, § 4º, inc. III, da Constituição da República, determinando a aplicação da regra do art. 57 da Lei n. 8.213/1991, no que coubesse.
6. Com a edição da Emenda Constitucional n. 47/2005, foram introduzidas duas novas hipóteses, que, se configuradas, podem gerar ao servidor público o direito à aposentadoria especial: ser portador de deficiência ou exercer atividade de risco.
Verifica-se que as decisões anterior proferidas em mandados de injunção pelo Supremo Tribunal Federal promoveram a integração da norma constitucional sobre aposentadoria especial nos termos do inc. III do § 4º do art. 40 da Constituição da República, pois tiveram como sujeitos ativos servidores públicos que exerciam suas atividades sob condições especiais que prejudicam a saúde ou a integridade física.
Assim, caracterizada a mora legislativa e a titularidade do direito dos impetrantes, foi concedida parcialmente a ordem para lhes assegurar a aplicação do art. 57 da Lei n. 8.213/1991, no que coubesse e a partir da comprovação dos seus dados pela autoridade administrativa competente.
Comprovou-se a identidade da hipótese descrita no caput do art. 57 da Lei n. 8.213/1991 e aquela do inc. III do § 4º do art. 40 da Constituição da República. Daí a viabilidade da integração dessa norma constitucional carente de regulamentação pela aplicação do artigo regulamentador do direito à aposentadoria especial dos segurados do Regime Geral da Previdência Social.
7. A questão em exame neste mandado de injunção diferencia-se, entretanto, daquela posta nos precedentes ora mencionados e naqueles citados pelo Impetrante, razão pela qual não é possível se valer da solução jurídica antes adotada.
Na espécie vertente, não se tem situação de insalubridade a justificar o alegado direito do Impetrante à aposentadoria especial.
Por comprovadamente exercer atividade de risco, o Impetrante tem direito à aposentadoria especial nos termos do inc. II do § 4º do art. 40 da Constituição da República. Contudo, as circunstâncias específicas as quais se submete foram objeto de regulamentação pela Lei Complementar n. 1.109/2010 do Estado de São Paulo:
“LEI COMPLEMENTAR N. 1.109, DE 6 DE MAIO DE 2010. Dispõe sobre requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria voluntária aos integrantes da carreira de Agente de Segurança Penitenciária e da classe de Agente de Escolta e Vigilância Penitenciária, e dá providências correlatas.
O GOVERNADOR DO ESTADO DE SÃO PAULO: Faço saber que a Assembleia Legislativa decreta e eu promulgo a seguinte lei complementar:
Artigo 1º – Esta lei complementar dispõe sobre os requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria voluntária aos integrantes da carreira de Agente de Segurança Penitenciária e da classe de Agente de Escolta e Vigilância Penitenciária, em razão do exercício de atividades de risco, nos termos do inciso II do § 4º do artigo 40 da Constituição Federal” (grifos nossos).
A lei complementar necessária à integração normativa do art. 40, § 4º, inc. II, da Constituição da República, viabilizadora do direito à aposentadoria especial pelo exercício de atividade de risco por integrante da carreira de Agente de Segurança Penitenciária e de Agente de Escolta e Vigilância Penitenciária do Estado de São Paulo, existe, é eficaz e deve gerar os efeitos nela previstos.
Este Supremo Tribunal Federal assentou constituir pressuposto de cabimento e admissibilidade do mandado de injunção a omissão legislativa que inviabilize o exercício de direito constitucionalmente assegurado ao Impetrante. Assim, por existir e ser aplicável à espécie a Lei Complementar n. 1.109/2010 do Estado de São Paulo, regulamentadora do direito constitucional pleiteado, é incabível a presente impetração. Nesse sentido:
“O reconhecimento da existência e da aplicabilidade de norma infraconstitucional regulamentadora do direito constitucional pleiteado evidencia o não cabimento do mandado de injunção, por inexistir omissão legislativa inviabilizadora do exercício de direito constitucionalmente assegurado. 3. Impossibilidade de conjugação do sistema da Lei Complementar n. 51/1985 com o do art. 57 da Lei n. 8.213/91, para com isso, cogitar-se de idade mínima para aposentação. Precedentes. 4. Agravo regimental ao qual se nega provimento” (MI 2.518-AgR, de minha relatoria, Plenário, DJe 13.5.2011).
“MANDADO DE INJUNÇÃO – OBJETO. O mandado de injunção pressupõe a inexistência de normas regulamentadoras de direito assegurado na Carta da República” (MI 701, Rel. Min. Marco Aurélio, Plenário, DJ 4.2.2005).
“A existência de um direito ou liberdade constitucional, ou de uma prerrogativa inerente a nacionalidade, a soberania ou a cidadania, cujo exercício esteja inviabilizado pela ausência de norma infraconstitucional regulamentadora, constitui pressuposto do mandado de injunção. III. Somente tem legitimidade ativa para a ação o titular do direito ou liberdade constitucional, ou de prerrogativa inerente a nacionalidade, a soberania e a cidadania, cujo exercício esteja inviabilizado pela ausência da norma infraconstitucional regulamentadora. IV. Inocorrência, no caso, do pressuposto de inviabilização de exercício de prerrogativa constitucional. V. Agravo regimental improvido” (MI 375-AgR, Rel. Min. Carlos Velloso, Plenário, DJ 15.5.1992).
“AGRAVO REGIMENTAL NO MANDADO DE INJUNÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ART. 40, § 4º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. PRESSUPOSTOS DE CABIMENTO. 1. Constituem pressupostos de cabimento do mandado de injunção a demonstração pela Impetrante de que preenche os requisitos para a aposentadoria especial e a impossibilidade de usufruí-la pela ausência da norma regulamentadora do art. 40, § 4º, da Constituição da República. Precedentes. 2. Agravo regimental ao qual se nega provimento” (MI 4.500-AgR, de minha relatoria, Plenário, DJe 1º.8.2012).
A essência do mandado de injunção é garantir a efetividade da Constituição da República.
No caso em exame, a existência de lei complementar que estabelece critérios diferenciados para a aposentadoria especial de integrante da carreira de Agente de Segurança Penitenciária e de Agente de Escolta e Vigilância Penitenciária no Estado de São Paulo torna inviável este mandado de injunção, por não inexistir lacuna legislativa necessária ao seu cabimento.
8. Ademais, não é juridicamente possível conjugar o sistema da Lei Complementar n. 1.109/2010 do Estado de São Paulo com o da Lei n. 8.213/1991, pois este Supremo Tribunal assentou ser vedada a conjugação de regras mais favoráveis de regimes diferentes para, com isso, cogitar-se de idade mínima para aposentação. Nesse sentido:
“Inexiste direito adquirido a determinado regime jurídico, razão pela qual não é lícito ao segurado conjugar as vantagens do novo sistema com aquelas aplicáveis ao anterior. III – A superposição de vantagens caracteriza sistema híbrido, incompatível com a sistemática de cálculo dos benefícios previdenciários” (RE 575.089, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Plenário, DJe 24.10.2008).
“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. IMPOSSIBILIDADE DE CONJUGAÇÃO DE REGRAS MAIS FAVORÁVEIS DE DIFERENTES REGIMES. PRECEDENTE DO PLENÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO” (AI 682.195-AgR, de minha relatoria, Primeira Turma, DJe 23.10.2009).
“APOSENTADORIA ESPECIAL – SERVIDOR PÚBLICO – TRABALHO EM AMBIENTE INSALUBRE – PARÂMETROS. Os parâmetros alusivos à aposentadoria especial, enquanto não editada a lei exigida pelo texto constitucional, são aqueles contidos na Lei n. 8.213/91, não cabendo mesclar sistemas para, com isso, cogitar-se de idade mínima” (MI 1.083, Rel. Min. Marco Aurélio, Plenário, DJe 3.9.2010, grifos nossos).
9. Pelo exposto, nego seguimento ao mandado de injunção (art. 21, § 1º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal), prejudicada a medida liminar pleiteada.
Publique-se.
Brasília, 25 de fevereiro de 2013.
Ministra CÁRMEN LÚCIA
Relatora